Era uma vez o Dono das Palavras...
O Dono das Palavras era menino moço, recém chegando à idade de se dizer homem, e por isso já não podia mais possuir a sinceridade da mocitude, tampouco controlar a ira típica de tal fase, que agora era vulcão em seu peito. Tudo erupcionava naquele peito. Tudo se permitia quando a dor o visitava.
O Dono das Palavras fora educado para ser discreto, ser doce, ser ordeiro, para quase ser servil; mas o garoto-homem agora estava chateado, furioso com a situação.
E, mesmo sabendo que possuía grandes responsabilidades como o "Dono das Palavras", ele agora se sentia tentado. Queria falar da dor e da decepção em ser trocado, da raiva em ser enganado, das palhaçadas em ser "investigado", o garoto-homem queria que suas palavras ferissem como estilete o coração de quem o deixou sangrando, queria o Dono das Palavras fazer uso de sua única arma, mas queria que fosse assim, movido por esse turbilhão de emoções; pois do contrário, sabia que não o faria.
O garoto-homem não havia gostado de ter seu tempo entregue a quem não viu na reciprocidade uma virtude, e queria justiça com as próprias mãos, ou melhor, com as palavras das quais é o Dono. Queria falar tudo, gritar cada letra, sentir a garganta rasgar com a força do som, e a voz se afogar nas lágrimas que dele corriam sem sessar, queria se esgotar em verdades, e queria sumir.
Mas o garoto-homem, o Dono das Palavras, não o fez. Deixou de usar de sua única arma, por entender que a guerra já estava perdida. E mesmo se sentindo burro em ser crédulo, burro em ser paciente, burro em ser persistente, burro em querer controlar suas Palavras, foi fiel, guardou suas Palavras, doeu seus sentimentos, e depois os escondeu na madrugada, onde só ele poderia encontrar novamente.
E assim, o garoto-homem, Dono das Palavras virou mais uma página, terminou um capítulo de sua fábula sem muita moral.